
AGÊNCIA CBIC
O negociado deve prevalecer
Mesmo que patrões e empregados consigam se entender, ainda é preciso superar a tutela da Justiça do Trabalho, que não reconhece o princípio do acordo coletivo
Os acordos coletivos surgiram como uma maneira de complementar as Consolidações das Leis de Trabalho (CLT) em busca de modernizá-la para a complexidade do mercado. Mas são também alvo de polêmica, uma vez que é necessário, segundo o jurista e ex-ministro do trabalho Almir Pazzianotto, um entendimento claro do artigo 114 da Constituição, o qual ele acusa de exageradamente tutelar e autoritário ao impor à Justiça do Trabalho regimento das relações trabalhistas, independentemente das decisões pacíficas tomadas entre patrão e empregado.
"Precisamos que o negociado entre as partes prevaleça", apontou Pazzianotto, durante o seminário Novas relações trabalhistas para o Brasil do século 21, realizado semana passada no Correio.
Segundo o jurista, as modificações pretendidas nos parágrafos 2.º e 3.º deste artigo são "desnecessárias e perigosas". "Basta comparar os textos recém-atualizados e as novas emendas para reconhecer a inoportunidade e inconveniência da iniciativa", diz. E ele continua, afirmando que essa insegurança jurídica estimula relações conflituosas, cada vez mais contaminadas por um elevado grau de litigiosidade. "Então, os tribunais continuam abarrotados de processos e aumentando os investimentos em resolução de conflitos", inferiu.
Outra solução para que o princípio da negociação coletiva seja respeitado e passe a vigorar está na ratificação da Convenção 151, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que garante o direito de acordo coletivo no serviço público. "A legislação do trabalho perdeu aquelas que deveriam ser as principais características: procurar a conciliação, atuar com simplicidade e oferecer segurança ao jurisdicionado", criticou Pazzianotto, que lembrou das tentativas de ambiciosas, porém frustradas, de revisão da legislação em 1970, 1979 e no primeiro governo Lula.
Alterar detalhes mínimos da legislação, segundo ele, sempre esbarrará em obstáculos ideológicos. "Há o temor de deputados e senadores de desagradarem as centrais sindicais, a dificuldade de legislar enfrentada pelos parlamentares e na inexistência de coesão patronal", enumerou. Por outro lado, Pazzianotto reconhece os esforços pioneiros de alguns sindicatos para a valorização da negociação coletiva mesmo diante de resistências do Ministério Público do Trabalho e de decisões desfavoráveis da Justiça.
Modelo de regulação
O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), João Oreste Dalazen, critica duramente, por sua vez, o modelo de regulação das relações individuais do trabalho. "É caracterizado pelo intervencionismo forte da Justiça, um modelo excessivamente rígido e fechado, quase sem espaço para a negociação", diz. Como resultado, segundo ele, empregados e empregadores quase não mantêm diálogo, pois a lei deixa pouco ou nenhum espaço de adaptação para esses atores sociais.
Mas Antônio Lisboa, diretor-executivo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), atribui essa tutela demasiada a uma falta de estrutura dos sindicatos brasileiros, que impedem o avanço nas relações de trabalho. "Quanto menos organização e liberdade sindical tivermos no país, mais será necessária a intervenção judicial."
Para Gilson Pinheiro, secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Entidades Sindicais, Associações, Federações, Confederações e Cooperativas no Distrito Federal (Sintes-DF), as negociações coletivas enriquecem os acordos entre empregador e trabalhador. "É um modelo em que saímos da realidade celetista para a realidade de fato, pois colocamos a importância de se fazer adequações em atender necessidades básicas dos trabalhadores", diz.
Mas ele lembra que nem sempre o processo de negociação é estável e bem-sucedido. O fechamento de acordo coletivo é uma negociação acirrada. "Em alguns casos o empregador sabe a realidade do lado oposto, mas existem vários outros que não buscam soluções para os problemas", observa. "Também existem dificuldades pelo lado trabalhista. Alguns se negam a fechar acordo e até criam manobras que dificultam uma conciliação", lamenta.
Autor(es): Guilherme Lobão Especial para o Correio – Colaborou Carlos Júnior Garcia
Fonte: Correio Braziliense (14/11/2012)