
AGÊNCIA CBIC
25/06/2012
Grandes grupos formam sua própria mão de obra
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25/06/2012 :: Edição 345 |
Valor Econômico/BR 25/06/2012
Grandes grupos formam sua própria mão de obra Iniciativas reduzem escassez de profissionais na construção de empreendimentos. Cresce a participação feminina
Em 2005, quando uma pesquisa constatou baixa oferta de mão de obra local para atender à grande demanda da construção da hidrelétrica Santo Antônio, em Porto Velho (RO), a Odebrecht Energia colocou em marcha um ambicioso programa de capacitação profissional. Desde então, o chamado Projeto Acreditar capacitou mais de 40 mil trabalhadores na região. A iniciativa também foi adotada nas obras para a construção da Usina Hidrelétrica de Teles Pires, no Mato Grosso. Lá, mais de 4 mil trabalhadores se inscreveram e 2 mil já foram capacitados. Até hoje, a Odebrecht Energia investiu cerca de R$ 44 milhões em capacitação de pessoal em 11 estados do Brasil e em outros oito países. Foram 137 mil trabalhadores inscritos no programa no mundo – 52 mil qualificados e 33 mil contratados no Brasil.
O projeto da Odebrecht é um exemplo das alternativas adotadas pelas construtoras diante da absoluta escassez de mão de obra para erguer os grandes empreendimentos de energia. "Quando começamos o programa em Porto Velho, contratávamos 30% de mão de obra local e 70% vinha de outros estados. Hoje, a proporção já é de 80% de profissionais locais e 20% de mão de obra de fora", explica Antônio Cardilli, criador do projeto, que já investiu R milhões nos últimos três anos na região. Na visão do executivo, o programa possibilita ganhos para as duas partes. "Nós temos profissionais que moram na região e os trabalhadores têm carteira assinada, melhores salários e uma formação que lhes permitirá disputar uma nova colocação profissional quando a obra acabar", afirma.
Na Camargo Corrêa, o programa de formação de mão de obra foi desenvolvido em parceria com o Senai/RO e o Instituto Camargo Corrêa. Chamado de Geração Sustentável, o projeto foi criado com a meta de capacitar dez mil pessoas em 31 cursos no período de 36 meses de implantação da Usina Hidrelétrica Jirau. O foco está na capacitação de moradores dos municípios de Porto Velho, Nova Mamoré, Guajará-Mirim e Candeias do Jamari. Até agora, segundo a assessoria de comunicação do grupo, foram implantados 27 cursos visando à qualificação de pedreiros, carpinteiros, armadores, mecânicos, eletricistas e operadores de máquinas, entre outros.
Para Divonzir Gusso, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (lpea), a demanda por mão de obra para o setor de energia e a necessidade de levar os trabalhadores para regiões distantes dos grandes centros urbanos, como o Norte do país, estão motivando as empresas a desenvolver programas e também a oferecer melhores salários e boas condições de alojamento e moradias. "Entre os anos 80 e o começo de 2000, o Brasil viveu um período com poucos investimentos públicos em infraestrutura. A partir de 2000, iniciativas como as previstas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Minha Casa, Minha Vida e grandes obras em estradas, barragens e portos ampliaram o volume de investimentos de 1% para 1,7% do PIB", afirma o pesquisador.
"Com tantas obras em andamento e necessidades em função até da Copa do Mundo, a tendência, nos próximos cinco anos, é de que os investimentos públicos em infraestrutura cheguem a 2% ou 2,5% do PIB. E isso vai demandar ainda mais mão de obra", observa.
De acordo com Gusso, a demanda maior é por mão de obra mais simples, como instalador hidráulico, azulejista e armador de ferro. Na mão de obra especializada, como engenheiros, há, segundo ele, oferta de profissionais nas mais diversas habilitações, mas há também dificuldade em deslocar essas pessoas para lugares mais distantes.
Para o presidente da Câmara Brasileira da Indústria de Construção (CBIC), Paulo Safady Simão, os programas de capacitação criados pelas empresas são necessários porque o setor trabalha hoje a um ritmo impossível de ser pensado há dez anos. "A indústria vive novos tempos e possui novos desafios. Entre eles, o de superar a falta de mão de obra qualificada." Conforme Simão, a escassez ficou mais acentuada no primeiro trimestre de 2010.
O eletricista Astrogildo Fonseca, de 46 anos, é um dos profissionais que passaram pelo programa de capacitação da Odebrecht. Um dos pioneiros do projeto, ele se orgulha de ter levado para lá sua esposa, Zuleide Moreira, de 38 anos, e agora seu filho. A esposa inicialmente fez um curso de cozinheira, mas optou depois pelo de soldadora, por ver que tinha mais chances de progredir na empresa. O filho integra o Acreditar Júnior, na área de gestão. "Antes de participar do curso, eu fazia bicos em Porto Velho. Uma semana tinha trabalho e na outra, não. Hoje tenho um diploma e carteira assinada, um salário de R,2 mil, que, com o adicional pelo risco da atividade, chega a R$ 3,5 mil, e até uma moto", afirma.
Como Zuleide, muitas outras mulheres fazem carreira em grandes obras. Segundo Cardilli, da Odebrecht Energia, a participação da mão de obra feminina cresceu nos últimos anos e hoje representa 10% no efetivo da empresa. Elas trabalham como pedreiras, armadoras, operadoras de máquinas e carpinteiras, além de exercerem as funções tradicionais nos setores administrativo e de enfermagem.
Na opinião do presidente da CBIC, uma iniciativa que vem estimulando a participação feminina no setor foi a criação de um programa, em conjunto com o governo federal, voltado à qualificação dos beneficiários do Bolsa Família. "Um dos principais diferenciais desse programa é a inclusão da mão de obra feminina nos canteiros da construção de todo o país. Desde que o programa foi criado, quase 80% dos formandos são mulheres", afirma.
Gustavo Leal, diretor de operações do Senai, confirma o interesse das mulheres por essa atividade. Segundo ele, 8% dos participantes de cursos voltados para a construção são hoje mulheres. "O setor registrou muitas mudanças, com inclusão de novas tecnologias, que permitiram uma maior participação feminina", diz.
Para o presidente da CBIC, o maior entrave para os investimentos em qualificação reside na alta rotatividade dos trabalhadores. "Um segundo problema é a má qualidade da educação básica, que depende, sobretudo, da ação do governo", afirma.
Além das ações promovidas por um volume expressivo de empresas no país inteiro para estimular a capacitação profissional de trabalhadores para o setor, Simão destaca as parcerias que vêm sendo desenvolvidas em conjunto com o Senai de vários estados para a criação de Escolas da Construção e outros programas de treinamento de mão de obra. No ano passado, o Senai promoveu 151 cursos destinados à qualificação de mão de obra do setor, com um total de 102 mil matrículas.
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