
AGÊNCIA CBIC
06/03/2012
Futuro vertical Entre arranha-céus de mil metros de altura e jardins suspensos, cidades testam modelos sustentáveis
![]() |
06/03/2012 :: Edição 280 |
O Globo/BR 06/03/2012
Futuro vertical Entre arranha-céus de mil metros de altura e jardins suspensos, cidades testam modelos sustentáveis Futuro vertical
Entre arranha-céus de mil metros de altura e jardins suspensos, cidades testam modelos sustentáveis
UMA VISÃO DO FUTURO nas Ilhas Khazar: a facilidade dos deslocamentos recebe elogios, mas a agressão a um ecossistema quase intocado, e com construções de tamanho desnecessário, provocaram protestos entre urbanistas e ambientalistas do mundo inteiro
Dono de uma das economias que mais cresce no mundo, alavancada por petróleo e gás, o Azerbaijão se tornará agora cenário de uma das mais polêmicas e ousadas experiências urbanas da Terra. Um arquipélago de ilhas artificiais será construído no Mar Cáspio e numa delas será erguido o maior arranha-céu do mundo, com 1.050 metros de altura. Para seus criadores, trata-se de uma empreitada sustentável. Para os críticos, uma aberração ecológica. O projeto conjugará o luxo de spas e shoppings a escritórios comerciais – praia e trabalho ficarão a menos de 15 minutos a pé. Haverá vilas em ilhas mais isoladas. O centro terá edifícios de diversos tamanhos e estilos. Em meio a eles, o Azerbaijan Tower, o gigante de concreto.
As Ilhas Khazar são um exemplo das discussões sobre o futuro das cidades. Há quem aposte em arranha-céus – o arquipélago vai nesta direção. Outro grupo prefere prédios ambientalmente corretos que pareceriam samambaias gigantes, entre outras soluções reunidas sob um guarda-chuva chamado "arquitetura verde".
Presidente da Avesta, companhia à frente do empreendimento azerbaijano, Haji Ibrahim vende-o como uma cidade futurista. Mas as Ilhas Khazar, como foram batizadas, acertam em poucos pontos, dizem especialistas. O ponto positivo é a mobilidade. Arquitetos e urbanistas esperam que, nas próximas décadas, metrópoles sejam capazes de reunir, em raios de 300 metros, todas as atividades e serviços necessários para a vida de um citadino. Em outros aspectos, no entanto, o arquipélago passa longe. Plantar dezenas de ilhas em uma região quase virgem do Mar Cáspio parece para muitos especialistas uma receita para o desastre ecológico.
Membro proeminente da sociedade azerbaijana, o empresário Ibrahim garante que seu projeto é sustentável. Companhias responsáveis por construir as ilhas artificiais na Europa estão ao seu lado. Está difícil, porém, angariar apoio entre quem não nutre interesse econômico no local.
– Não vejo sentido neste projeto, e não digo apenas sob a ótica da sustentabilidade – ressalta o arquiteto Antônio Macêdo Filho, representante no Brasil do Conselho de Edifícios Altos e Habitats Urbanos, com delegados em mais de 40 países. – Não há por quê construir enormes empreendimentos onde não há quase nada, usando mão-de-obra temporária estrangeira, sem agregar benefício social local.
Especialistas ouvidos pelo GLOBO asseguram: talvez, no futuro, não tenhamos que transitar entre monólitos envidraçados que nos privam da vista do céu. Mas, aqui embaixo, há muito o que fazer.
Primeiro mandamento: quanto menos nos deslocarmos, melhor. E, se o fizermos, que seja por transporte coletivo.
– Quatro milhões de pessoas vão diariamente da Zona Leste de São Paulo para o Centro – destaca Macêdo. – Estas migrações intraurbanas tendem a diminuir se houver trabalho, lazer e moradia próximos um ao outro. Em Manhattan, Nova York, só um entre cada quatro moradores tem carro. As pessoas preferem se deslocar a pé ou usar metrô.
São Paulo não está sozinha entre os maus exemplos. O país inteiro padece do mesmo problema de sua maior metrópole: a falta de planejamento. O poder público adota projetos pontuais, em vez de ver o espaço urbano como um só.
– A França fez, no ano passado, em torno de mil concursos públicos para contratação de projetos. No Brasil, foram apenas 16 – compara Gilson Paranhos, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB). – Na Holanda, as autoridades vão trabalhar de bicicleta. Mesmo que comecemos distante dessa realidade, por que não tentamos atingi-la? Já não dá para argumentar que somos um país de Terceiro Mundo.
Segundo Paranhos, mesmo as tragédias não nos fazem aprender. A Região Serrana, destruída pelas chuvas em janeiro do ano passado, recebeu milhões de reais do governo federal, mas ainda têm bairros infestados de lama. O desvio de verbas explica em parte este descaso, mas outra fatia vem da falta de projetos.
A última cidade brasileira planejada – e em 1960, numa ótica já ultrapassada – é Brasília. Desde então, os municípios têm se alastrado, em vez de se condensarem. O resultado: primeiro chegam os moradores; depois, serviços primordiais, como asfalto, saneamento básico, fornecimento de água. Na Zona Oeste do Rio, este problema é visível.
– Quanto mais expande um centro urbano, mais caro é mantê-lo, porque é necessário alimentá-lo com água, esgoto e novas vias – explica o arquiteto Márcio Tomassini de Oliveira. – Cabe ao Estado fazer um acordo com a especulação imobiliária e usar áreas onde há uma infraestrutura pronta, mas ociosa. Em vez de inflar o Rio da Barra da Tijuca para Sepetiba, por que não ocupamos as áreas disponíveis na Zona Portuária?
|
|
![]() |