Jornal O Estado de S.Paulo/BR – 05/06/2011
a hora das cidades compactas
Evento em SP receita adensamento urbano planejado em metrópoles como arma no
combate ao aquecimento global
Gustavo Bonfiglioli – O Estado de S.Paulo
Quanto maior a cidade, maiores os impactos. Seja no transporte, drenagem das
águas ou na construção civil,
megacidades como São Paulo pagam o preço da expansão não planejada. Segundo
Miguel Bucalem, secretário de Desenvolvimento Urbano da capital, a dinâmica da
cidade pode gerar deslocamentos entre a casa e o trabalho de até 4 horas. E é
por conta justamente dessa demanda por transporte que muitas áreas de baixa
densidade populacional puxam para cima as emissões de gases estufa.
"Não é uma regra absoluta, mas, na maioria dos casos, baixas densidades
significam altas emissões", afirma Andrea Fernandez, pesquisadora da
empresa de arquitetura e planejamento urbano internacional Arup, com sede em
Londres.
Andrea esteve entre 31 de maio e 3 de junho no C40, cúpula internacional que
reuniu 47 metrópoles para a troca de ideias sustentáveis. Ela apresentou um
estudo que mostra a forte conexão entre emissões de gases estufa e densidade
demográfica, baseado na realidade das cidades do C40.
O tema das cidades compactas, que diminuem a distância entre a casa e o
trabalho, foi discutido amplamente entre prefeitos e representantes de cidades.
Uma das soluções citadas para mitigar as emissões que os deslocamentos
causam é adensar áreas urbanas já consolidadas, por meio da verticalização de
construções. Com a limitação da expansão territorial, surge também uma outra
necessidade nas cidades: a de ter espaços eficientes e multiuso.
"Em Roterdã (Holanda), há alguns anos apenas 5% da população vivia na
cidade. Tínhamos que mudar isso. Não podemos mais aumentar nossas cidades, e
sim deixá-las mais densas e distribuir suas populações, com maior mobilidade e
interação social", defende Paula Verhoeven, diretora de sustentabilidade
da prefeitura de Roterdã.
"Cidades sustentáveis são compactas", defende Richard Rogers,
arquiteto responsável pelo projeto do Centro Pompidou, em Paris. Nem sempre o
excesso de densidade é benéfico, é claro. Mumbai, na Índia, tem 30 mil
habitantes por quilômetro quadrados em algumas regiões – e é um exemplo da
falta de planejamento sustentável.
O conceito de cidade compacta não pode ser resumido por fórmulas, e sim
pensado de acordo com a realidade de cada metrópole. Confira seis medidas que
São Paulo poderia adotar em seu planejamento urbano para ser mais compacta e
eficiente.
ESPAÇOS MULTIUSO CRIATIVOS
Reduzir cidades e torná-las eficientes implica pensar espaços
multifuncionais de modo criativo. O telhado verde nos edifícios, muito comum
nas cidades de Nova York e Barcelona, ajuda a capturar gás carbônico e a
aumentar a área verde da cidade. A tecnologia também contribui com a drenagem
das águas. Em Roterdã, na Holanda, "praças de água" estão sendo
construídas. Em épocas de seca, são espaços de convivência, lazer e esporte.
Com as chuvas, viram piscinões que armazenam água e evitam enchentes.
TUDO NUM MESMO BAIRRO
Ainda para evitar o maior vilão do aquecimento global, o deslocamento, é
importante, ao planejar uma cidade compacta, ter bairros com múltiplas funções,
como moradia, comércio, postos
de saúde, creches e escolas. Segundo a vice-prefeita de Paris, Anne Hidalgo, a
cidade deve fugir do urbanismo de zonas e da desigualdade de territórios – como
em São Paulo, que segue a Lei de Zoneamento, de 1972. "Em Paris, também há
bairros onde se trabalha e outros onde se mora. A cidade ecológica deve mesclar
tudo em cada bairro."
VOLTAR A MORAR NO CENTRO
Cidade sustentável deve ter políticas habitacionais no centro. Paris exigiu
que metade das novas construções na região central fosse ocupada pela população
de baixa renda. Em dez anos, a cidade, com 2 milhões de habitantes, levou 30
mil à região. Miguel Bucalem diz que a prefeitura de São Paulo quer fazer o
mesmo com o projeto Nova Luz, no bairro Santa Ifigênia. Associações de
moradores resistem: para elas, por ser da iniciativa privada, o projeto criaria
especulação imobiliária e expulsaria moradores e comerciantes.
EMPREGO MAIS PERTO DE CASA
Apesar da importância de repovoar bairros centrais em que há muito emprego
para poucos habitantes, o contrário também é igualmente relevante. A relação de
emprego/habitante, em alguns bairros da zona leste, é de 0,2; em outros,
centrais, chega a 10. A densidade demográfica de São Paulo já é grande, de 7,3
mil habitantes/km2. Para evitar o adensamento excessivo em regiões centrais,
Bucalem defende a geração de empregos em bairros distantes do centro para
evitar grandes deslocamentos de moradores.
INVESTIR EM CORREDORES VERDES
O aumento da cobertura verde da cidade deve ser feito de modo estrutural,
não só pensando no aspecto decorativo. Barcelona, na Espanha, e Stuttgart, na
Alemanha, são cidades que criaram corredores de vegetação que conectam parques
e áreas verdes urbanas. Isso ajuda a homogeneizar a distribuição dos ventos na
cidade e evita as ilhas de calor. Ao priorizar o pedestre e as bicicletas, os
corredores verdes também incentivam que os cidadãos não saiam de carro,
deixando as vias públicas livres de trânsito.
INCENTIVAR O TRANSPORTE ALTERNATIVO
Investir em carros elétricos e biocombustíveis é importante, já que ajudam
no problema das emissões. Porém, não diminuir o número de carros e a demanda
por transporte automotivo nas ruas significa mais trânsito. Copenhague investiu
em ciclovias e no incentivo ao transporte via bicicleta. Lá, 55% dos seus
moradores vão e voltam do trabalho de bike. O fomento ao meio de transporte,
aliado a iniciativas como os corredores verdes e bairros planejados, pode ser
uma boa solução para o excesso de carros nas ruas.
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