Valor OnLine/BR
Boas práticas evitariam perdas de US$ 1,6 trilhão
Takaoka: recursos suficientes para saldar cinco vezes a dívida da Grécia
Se as construtoras do Brasil e do mundo inteiro utilizassem as tecnologias disponíveis no mercado, evitariam um desperdício de cerca de US$ 1,6 trilhão por ano. Além de poupar a natureza, saldariam cinco dívidas da Grécia, conforme cálculos de Marcelo Takaoka, presidente do Conselho Deliberativo do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS), com base em dados das Nações Unidas.
A construção civil aparece como solução para a criação de 1,2 bilhão de empregos que, segundo previsões do Massachusetts Institute of Technology (MIT), o mundo demandará nos próximos dez anos. Serão necessários cerca de 120 milhões de postos de trabalho por ano para evitar problemas sociais. Atualmente, a construção civil emprega 111 milhões de pessoas no mundo e tem potencial para crescer em progressão geométrica, caso siga os indicadores de sustentabilidade.
A maioria dos incorporadores reconhece a importância da sustentabilidade na construção civil, mas poucos ousam pôr essas práticas em ação. Na pesquisa para sua tese de doutorado, Hamilton França Leite, diretor de sustentabilidade do Secovi-SP, ouviu cerca de 800 pessoas sobre a principal dificuldade para construir de forma sustentável – entre elas 584 ligadas ao setor imobiliário das quais 237 incorporadores. 82% dos incorporadores responderam que o maior empecilho é o custo adicional da obra. Aqueles com mais experiência no ramo estimaram que esse custo representaria entre 1,5% e 8,3% a mais em relação à obra convencional. Os entrevistados que nunca construíram imaginam que esse adicional representa entre 3,4% e 16%. Embora não haja ainda nenhum empreendimento residencial que sirva como paradigma, França Leite estima que o custo representa 4% sobre a construção convencional.
Um empreendimento de R$ 30 milhões, por exemplo, chegaria a um custo final de R$ 31,2 milhões, pelos cálculos de França Leite. "Se o incorporador decide assumir o risco, quanto o comprador final vai se dispor a pagar a mais por um imóvel sustentável?", foi a pergunta que ele incluiu em sua pesquisa. 16% dos entrevistados responderam sim. "Mas a grande dúvida é se na hora de mexer no bolso esse consumidor pagaria a mais para ter torneiras inteligentes, redução do consumo de energia, aproveitamento dos resíduos sólidos e mais qualidade de vida", diz. Como o assunto é novo para todos os públicos envolvidos, essas questões ainda estão por ser processadas. "Quem aprender antes os caminhos dos processos limpos vai ganhar mercado lá na frente", garante França Leite.
Quem vai despertar essa necessidade é o consumidor final, na opinião de Walter Caldana, diretor do curso de arquitetura da Universidade Presbiteriana Mackenzie. "Estamos num estágio em que temos o discurso, mas não temos a prática; há cinco anos não tínhamos nem o discurso", compara. O nível de exigência ainda é pequeno em relação ao valor do imóvel, mas quando o consumidor exigir e os programas de governo começarem a cobrar, o setor terá que incorporar a nova ordem. "Quem investir em sustentabilidade vai vender mais rápido e terá mais lucro, além de criar um nicho de mercado e se destacar da concorrência."
Enquanto o Brasil aparece em quarto lugar em certificações para edifícios corporativos, por exigência dos investidores, o cliente de habitação está em outro ritmo. "Brasileiro é imediatista: médio e longo prazo não faz parte da nossa cultura", diz Georgia Grace, assessora técnica da CBIC (Câmara Brasileira de Indústria e Construção). A poupança ambiental no setor da construção está no programa Minha Casa Minha Vida que, segundo Georgia, já entregou um milhão de casas e tem outro lote de 1,8 milhão a entregar. A formalização do setor reduziu drasticamente o desperdício da autogestão. A redução de um centímetro de massa no revestimento das paredes de 2 milhões de casas representou 2 milhões de m3 de areia que deixaram de ser retirados na natureza, além de uma economia de 612 mil toneladas de cimento e outras 867 mil toneladas de cal hidratada a menos. Essa economia se completa com os 167 mil caminhões que deixaram de circular e de produzir gás carbônico. "Em 2 milhões de unidades o Minha Casa Minha Vida fez uma economia de R$ 840 milhões, que equivalem ao custo de 12 mil casas", diz Georgia.
São raros os empresários ou projetistas que incorporam o conceito da sustentabilidade em suas iniciativas. Deveriam. Na opinião do professor Alex Abrico, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, a indústria da construção civil já deveria ter começado a diminuir os impactos. "Precisamos políticas públicas e incentivos para as construtoras que investem em edificações sustentáveis, para fornecedores que bancam as pesquisas e para consumidores que apostam em práticas sustentáveis", diz Abrico. Abatimento no IPTU e aceleração na aprovação do empreendimento seriam algumas vantagens.
O incorporador Ubirajara Freitas compara a fase atual do setor aos anos 1990, quando os programas de qualidade e o Código de Defesa do Consumidor mudaram a forma de fazer negócios. "Empresas que resistiram a nova ordem quebraram ou fecharam." Da mesma forma, Freitas acredita que as empresas que não tratarem de focar na sustentabilidade terão problemas de sobrevivência.
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