
AGÊNCIA CBIC
27/03/2012
Uma dívida social de R$ 420 bilhões
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27/03/2012 :: Edição 285 |
O Povo – Últimas/CE 27/03/2012
Uma dívida social de R$ 420 bilhões
A pequena Isabel dos Santos Lopes tem cinco anos. Brinca com irmãos e primos em ruas de terra batida às margens do Igarapé do Tucunduba, um dos 148 cursos de água que cortam Belém do Pará. A favela que se ergueu em torno do canal há mais de 40 anos é formada, na sua maioria, por casas e palafitas de madeira. Sem saneamento básico, todo o esgoto e lixo de 4.800 famílias que vivem ali são jogados diretamente no igarapé. A água é escura, cheira mal e em muitos trechos acumula montes de sacos plásticos, embalagens, garrafas pet e até restos de comida.
Na casa de Isabel, a água de torneira chega por canos de PVC que passam dentro do córrego. Muitos deles furados ou mal instalados. Há um ano, a água encanada misturada à do córrego contaminado deixaram Isabel doente. Teve diarreia intensa, depois vômitos constantes. Passou três semanas internada no Hospital das Clínicas de Belém. "Tive pavor que ela fosse morrer", conta a mãe, Maria Rita dos Santos. "Dois anos atrás perdi um filho, Davi Salomão, que gostava muito de tomar banho no córrego e acabou tendo dengue hemorrágica".
Maria Rita, Isabel e as famílias que moram às margens do Igarapé do Tucunduba fazem parte dos 105 milhões de brasileiros sem coleta de esgoto e dos 35 milhões que não recebem água tratada em casa. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 30% dos municípios brasileiros não têm qualquer serviço de saneamento básico. A falta de acesso a água de boa qualidade e a convivência com esgoto a céu aberto levam à proliferação de doenças como diarreias, esquistossomose, dengue e leptospirose, enfermidades que causaram 61 mil mortes, no Brasil, nos últimos dez anos.
Consequência
Estima-se que a falta de saneamento esteja diretamente ligada a 65% das internações em hospitais no País. Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância e Adolescência (Unicef), para cada real investido no setor, economizam-se quatro em serviços hospitalares. "Saneamento é uma das maiores formas de prevenção em saúde", disse a presidenta Dilma Rousseff ao assinar contratos para obras de água e esgoto em cidades com menos de 50 mil habitantes, no final do ano passado. "É uma obra escondida, que desaparece sob o chão depois que você faz, mas o resultado aparece nos dados de saúde", afirmou. "Não podemos mais ter crianças brincando junto ao esgoto".
Para mostrar essa realidade, a série de reportagens que tem início hoje percorreu dez cidades brasileiras que enfrentam diferentes desafios com relação às condições sanitárias oferecidas à população. Encontramos um país que avançou no combate à miséria, mas só agora despertou para um problema ambiental e de saúde pública que passa em frente à casa de milhões de pessoas.
No Rio de Janeiro, a Bacia da Guanabara é contaminada pelos dejetos que vêm principalmente da zona norte da cidade. Em Recife, os canais que cruzam os principais bairros exalam mau cheiro. Décadas de descaso só aumentaram o déficit e o tamanho do trabalho a ser feito. Hoje, o governo federal calcula que seja necessário aplicar R$ 420 bilhões no setor durante os próximos 20 anos.
Além dos investimentos, o Brasil também precisa melhorar a gestão dos serviços. Mais da metade das companhias estaduais de saneamento opera no vermelho, gastando mais do que arrecada. A ineficiência também se revela na água que é desperdiçada: das 27 unidades da federação, 19 perdem mais de 30% do volume tratado em vazamentos e ligações clandestinas.
E agora
ENTENDA A NOTÍCIA
O problema do saneamento básico exige das autoridades, numa perspectiva histórica, uma resposta melhor e mais eficiente. A discussão posta tem a ver com o presente, mas ganha mais importância quando se olha para o futuro.
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