Construção do saber

Correio Braziliense/BR

Construção do saber

» Raíssa Manso
Empreiteiras oferecem alfabetização para operários no local de trabalho. Programa atende a comunidades vulneráveis.
 Especial para o Correio
 A construção civil possui trabalhadores com as mais variadas funções, que vão desde os arquitetos e os engenheiros, até os pedreiros. Nesse último segmento, é comum a ausência de qualificação e o analfabetismo, pela falta de oportunidade que tiveram na infância, período em que deveriam ter frequentado a escola.
 Para inserir essas pessoas no mercado de trabalho e torná-las capacitadas profissionalmente, entidades e empresas do setor se uniram de maneira a ajudar os trabalhadores em sua educação. Ser alfabetizado em uma escola é normal, mas em um canteiro de obras é uma mudança que se tornou realidade para várias pessoas da área.
 A alfabetização em canteiros de obras também virou lei. As empresas que promovem o ensino terão preferência na contratação com órgãos públicos. De acordo com a Lei nº 5.028/13, os empregados deverão ser alfabetizados no local da obra ou do serviço e durante a sua execução, com supervisão da Secretaria de Educação.
 Por meio de parcerias entre o Serviço Social do Distrito Federal (Seconci-DF) e as empresas da construção civil, é oferecida, gratuitamente aos trabalhadores no local de trabalho, a oportunidade de dar continuidade ou iniciar os estudos. Os canteiros de obras contam com uma estrutura de sala de aula e profissionais qualificados, sendo oferecidos cursos de alfabetização, além do primeiro e, segundo segmento do ensino fundamental. As aulas são ministradas de segunda a quinta-feira, podendo ser no horário do almoço, após o trabalho, e, ainda, há empresas que disponibilizam uma hora da jornada de trabalho para a realização das aulas. O programa também atende pessoas da comunidade em condições de vulnerabilidade que precisam ser alfabetizadas.
 Conscientização
 Com 22 anos de projeto, foram atendidas mais de 11 mil pessoas. Segundo o Seconci-DF, o principal objetivo é levar o conhecimento às pessoas que, por diversos motivos, foram impedidas de estudar, além de capacitá-las para que possam melhorar o desempenho nas atividades no canteiro de obras, bem como prepará-las para o cumprimento das normas de segurança do trabalho. No aspecto cultural, a meta é melhorar e conscientizar o trabalhador quanto ao papel dele na sociedade.
 A coordenadora pedagógica do Seconci-DF, Jaqueline Lemes, enfatizou a importância do programa para os trabalhadores atendidos. O projeto contribui na erradicação do analfabetismo quando um trabalhador que não conseguia escrever o próprio nome ou ler o itinerário dos ônibus, hoje, orgulhosamente, faz isso, além de apresentar seu documento, devidamente assinado , diz. Jaqueline também destacou a necessidade da aprendizagem para a segurança no local de trabalho. A alfabetização também atua na prevenção de acidentes, pois o trabalhador alfabetizado consegue ler e identificar a importância das placas, o que contribui para a diminuição do número de acidentes nos canteiros de obras , explica a coordenadora.
 Uma empresa de engenharia realiza, em parceria com o Seconci-DF e com a Secretaria de Educação, o projeto Alfabetização e Cidadania com os Trabalhadores da Construção Civil, que visa disponibilizar dos cursos de alfabetização e ensino fundamental para seus funcionários. A gestora de Qualidade da empreiteira, Helena Sirqueira, destaca que o projeto é um diferencial na vida dos alunos. Eles agora conseguem pegar ônibus sozinhos e podem ajudar no trabalho escolar do filho, assim se sentem valorizados na sociedade , enfatiza.
  Estímulo
 Atualmente, o projeto se encontra em todas as 14 obras da construtora, o que, segundo Helena, facilita a reter bons funcionários. Isso ajuda a manter o funcionário motivado, pois ele se sente valorizado e, assim, fica mais tempo na empresa, além de poder contribuir para a educação de cada um.
 Edmar de Carvalho, um dos trabalhadores beneficiados, afirma que o projeto de alfabetização tem lhe ajudado muito na educação. Estou aproveitando essa oportunidade que a empresa dá de voltar a aprender a ler e escrever. É muito bom esse projeto e espero aprender muito mais com as aulas que estou assistindo em meu local de trabalho , diz.
 A professora Fabiana Antônia é uma das alfabetizadoras que participa do programa e ensina jovens e adultos nos canteiros de obras. Para ela, é motivante ensinar adultos que possuem a vontade de aprender. É muito bom quando um aluno, que não sabia nada, começa a ler e a escrever. Essa quebra de preconceito e esse trabalho na autoestima deles é estimulante. Não busco reconhecimento. Minha busca é ajudar que cada um aprenda em sala de aula e, também, incluir socialmente aqueles que precisam , conta.
 Para a professora, é um desafio ensinar adultos, pois eles não tiveram a oportunidade de frequentar a escola na infância e, com isso, precisam de mais atenção. Percebi que eles tinham uma carência maior que as crianças em relação à educação, então aceitei esse desafio de ensiná-los .
 Outro aluno e operário, Rosenildo de Araújo enfatiza que pretende progredir na educação após o término das aulas no canteiro de obras. Gosto muito de aprender e quero continuar estudando. Saber nunca é demais, e é o que busco. Se eu tiver oportunidade, com certeza não vou abandonar os estudos , conta.
 "É muito bom quando um aluno, que não sabia nada, começa a ler e escrever. Essa quebra de preconceito e esse trabalho na autoestima deles é estimulante. Não busco reconhecimento. Minha busca é ajudar que cada um aprenda em sala de aula e, também, incluir socialmente aqueles que precisam"               
 Fabiana Antônia,  professora
 NÚMERO 11 mil
 Total de beneficiados pelos cursos em 22 anos de atuação