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18/06/2020

Artigo: Efeitos do coronavírus sobre contratos e obrigações cíveis

Carolina Ribeiro Botelho é advogada, sócia do escritório Andrade GC e diretora Jurídica da Ademi/AM

No intercurso de uma crise em escala global, os vários campos da interação humana passam por situações de estresse não antes previstas. O direito civil, notadamente o campo dos contratos, não está incólume. O presente artigo tem por objetivo analisar os impactos da crise ocasionada pela Covid-19 nos contratos cíveis estabelecidos e em curso.

Inicialmente, é importante configurar o coronavírus (Covid-19) como fator claramente caracterizado no âmbito dos eventos de força maior. Condições naturais que não podem ser controladas pelo ser humano, como raios, secas e, como no presente caso, uma pandemia em escala global.

Há previsão dos casos de força maior no Código Civil em seu art. 393. Assim, caracterizada a força maior, está autorizada a aplicação da excludente da responsabilidade da parte.

Porém, o que deve ser ponderado para a presente análise prática é: Qual o limite da aplicação deste instituto? É possível sua aplicação indiscriminada? De pronto a resposta deve ser negativa.

Em meio ao presente cenário, podemos verificar que várias empresas estão diminuindo, parando suas produções ou recebendo ordem do Estado para parar. Ou seja, serão obrigadas a dispensar funcionários, reduzir os contratos de serviços terceirizados ou mesmo deixar de cumpri-los. Uma cadeia produtiva será afetada e enfrentará situações terríveis da perspectiva financeira.

O reflexo disso será a possibilidade de se realizar a revisão de contratos ou mesmo sua resolução, pautando-se na onerosidade excessiva ou na aplicação da excludente ocasionada pela Covid-19, ambos autorizados pelos artigos 478, 479 e 393 do Código Civil.

Todavia, existem serviços que não foram afetados diretamente pelo evento ou que já se encontravam em colapso ou descumprimento antes de iniciados os efeitos da pandemia.

Nesses casos, é possível questionar a capacidade dessas partes invocarem a utilização do instituto da força maior para invocar a revisão ou a resolução, ou mesmo para inadimplir uma obrigação contratual.

Para averiguar tal possibilidade, devemos buscar na estrutura da obrigação o nexo causal.

Segundo os estudiosos do direito e de maneira simples, o nexo causal é a vinculação do ato da parte e o resultado por ela produzido. Sobre o tema é possível verificar que o art. 403 do Código Civil entende que causa é somente o evento que produz direta e concretamente o resultado danoso.

Portanto, para configuração do nexo causal da ação, é imperativo que haja ligação entre os efeitos da pandemia pela Covid-19 e o ato realizado ou omitido.

Logo, há clara impossibilidade de revisão ou rescisão de contratos tão somente pela existência mundial do vírus em curso, sem a demonstração clara do prejuízo, impossibilidade ou onerosidade gerados diretamente pela pandemia.

Não demonstrado o nexo entre a pandemia e o descumprimento do contrato, será passível a aplicação dos termos do art. 475 do Código Civil, para casos de descumprimentos contratuais indevidos, em que a parte lesada pelo inadimplemento poderá pedir a resolução do contrato ou seu cumprimento adequado, além de perdas e danos adequados ao evento.

O que se conclui, portanto, é que em contratos particulares, cada caso deverá ser analisado de forma isolada.

 

* O artigo foi divulgado no e-book Impactos jurídicos da Covid-19 na construção civil, do Conselho Jurídico da CBIC

**Artigos divulgados neste espaço não necessariamente correspondem à opinião da entidade.

 

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