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21/03/2018

REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA COMO FORMA DE PROMOVER O BEM ESTAR SOCIAL

“Nas regiões onde falta ação do poder público existem facções criminosas, milícias tomando conta de uma população esquecida, abandonada, marginalizada e excluída como se fossem leprosos que devessem ser afastados do convívio social.”

Durante o encontro das Primeiras Damas realizado em São Roque no dia 15 de março no Ski Mountain Park, o diretor da Solo Regular, Ronaldo Xavier Alves,  empresa que realiza o trabalho de regularização fundiária fez um  discurso chamando a atenção dos prefeitos para a importância da regularização dos documentos e da atenção que cada município deve dar aos bairros da periferia que vivem marginalizados por falta de ação do poder público. Veja a íntegra do discurso que foi assinado pela arquiteta e urbanista Adriana Cruz.
“Senhores e Senhoras.
Gestores públicos.
Aqui, nesta singela apresentação, se busca indicar àqueles que de alguma forma têm o poder/dever de efetivar as regularizações fundiárias nos municípios que governam.
Cabe identificar alguns pontos que nos parece didaticamente importantes, quando nos deparamos com questões fundiárias urbanas que se arrastam há décadas, destacando de forma fundamentada, a responsabilidade dos municípios diante dessa “causa social”, especialmente, porque restará sempre o dever de buscar a regularização fundiária, que de alguma forma deu causa diante da inércia fiscalizatória.
A falta de planejamento e de estrutura das cidades induziu a uma urbanização mal planejada, com ocupações irregulares e invasão de áreas de preservação permanente.
Vê-se então que a Regularização Fundiária Urbana é aquele conjunto de ações que busca integrar os assentamentos de moradia, ora ilegais, não atingidos por programas que visam integrar esses ditos assentamentos à cidade regularizada.
A Regularização Fundiária Urbana é um instituto necessário em praticamente todas as cidades de nosso país, onde a falta de conhecimento sobre o presente tema ajuda no agravamento da situação da população direta e indiretamente atingida.
Como introito, cabe ressaltar ainda que o procedimento de regularização fundiária segue diretrizes legais fundadas na necessidade de alcançar a solução urbanística e habitacional, especialmente como dispôs a Lei Federal nº 11.977/2009 (Programa Minha Casa, Minha Vida) e, agora, mais recentemente, a Lei Federal 13.465 de 11 de julho de 2017.
DA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA, ANÁLISE E CONCEITOS CONSIDERADOS SOB ÉGIDE DA LEGISLAÇÃO ATUAL
Em linhas gerais, pode-se dizer que o Processo de Regularização Fundiária Urbana inclui medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais, com o objetivo de integrar assentamentos irregulares ao contexto legal das cidades. Além de legalizar, visa também à promoção da cidadania, e é nesse ponto, indispensável para articulação de outras políticas públicas.
Verifica-se a interdependência e articulação de diversos institutos e conceitos, que remetem às normas, princípios e matérias jurídicas.
Nesse sentido, o diploma legal em vigor, estabeleceu também princípios que norteiam e orientam tal procedimento como instrumento de efetivação do processo de Regularização Fundiária Urbana. Dentre eles, vale destacar o alargamento do acesso à terra urbanizada pela população “vitimizada”, resguardadas as condições de sustentabilidade urbanística, assim como social e especialmente ambiental.
Destaca-se ainda, e especificamente, o estímulo à resolução extrajudicial de conflitos, o que alude à prevenção do estabelecimento de possíveis litígios, contribuindo para a efetivação da função social da propriedade e da “desjudicialização” dos procedimentos.
A Regularização Fundiária urbana por ser composta de vários campos, assenta-se de forma interdisciplinar e, por conseguinte, alcança inúmeros segmentos, sendo que, a nosso ver, o mais essencial deles é a função da propriedade e suas consequências sociais.
Nesta acepção, os artigos do Estatuto das Cidades são, em sua essência, o alicerce primordial para se estabelecer a importância do processo de Regularização Fundiária. A política urbana tem por escopo máximo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. E assim, para tal, traça diretrizes que promove de forma ordenada e eficaz o processo em tela.
Trata-se de garantia do direito a cidade, de forma sustentável, que compreendem direitos à geração contemporânea, bem como às futuras gerações. Estabelece garantia à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte, aos serviços públicos de primeira necessidade, ao trabalho e ao lazer.
Verifica ser possível, por intermédio de uma política de cooperação entre governo, iniciativa privada e por todos aqueles legitimados, a solução dessa demanda, onde o sucesso representa a devida atenção ao interesse social.
Nesse sentido, o projeto de Regularização Fundiária expõe também a ordenação e controle do uso do solo, com o objetivo de evitar a utilização imprópria dos imóveis urbanos, o parcelamento do solo, a edificação ou uso exacerbados ou inadequados da infraestrutura urbana, impedindo processos “naturais de favelização” e o agravamento da condição socioeconômica que naturalmente faz surgir, cada vez mais, polos produtores de violência social.
Nesse contexto, fez-se primordial a simplificação da legislação envolvida no processo de regularização fundiária, com o desígnio especial, de facilitar o atendimento da população duplamente penalizada, que como dito, foram inseridos numa ilegalidade que deixou de ser evitada “de ofício” pelos órgãos municipais fiscalizadores.
Enumera-se também, como reflexo da regularização fundiária, com relevância especial, a valorização imobiliária adequada e justa, respeitando o direito à propriedade privada sem olvidar da garantia constitucional da função social da propriedade.
Essa valorização intimida a prejudicial especulação imobiliária, fomenta o estímulo à economia de giro e à construção civil de modo absolutamente sustentável e funcional, promovendo inclusive o crescimento das cidades.
DO PROCEDIMENTO DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA COMO FORMA VINCULADA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Para efetivar o processo de Regularização Fundiária, a Administração Pública deve proceder através de atos administrativos amparados por princípios. Assim, mesmo havendo interesse estatal imediato, deve ter o condão final do interesse público sob pena de desvio de finalidade.
Podemos destacar alguns princípios norteadores da administração dentre os quais: legalidade, impessoalidade, eficiência, segurança jurídica, razoabilidade, proporcionalidade e função social da propriedade.
O interesse na Regularização Fundiária é coletivo. Trata-se de bem patrimonial local. É um desígnio de estabilidade da ordem social, pois já se reconhece hoje em dia que a segurança jurídica, a habitação e a função social da propriedade se tornaram condições essenciais para a própria existência da vida e sua manutenção.
Toda atividade administrativa deve ser autorizada por lei, por isso, grandes juristas e legisladores se debruçaram sobre o tema, traduzindo todo esse esforço em instrumentos legais que hoje podemos chamar de verdadeiros marcos legais, já que desde muito tempo, ainda utilizávamos de textos legais ultrapassadas e que já não mais representavam nossa verdadeira identidade ou realidade a ser enfrentada, especialmente quando a questão era a irregularidade fundiária.
Para gestores públicos comprometidos com uma boa administração e com a colheita de seus frutos políticos e sociais, a eficiência deve ser um dos princípios que mais devem ser perseguidos. No âmbito da administração pública adveio, infelizmente, o descontentamento da sociedade diante dos serviços de má qualidade que são prestados.
Aqui, vemos que o objetivo deve ser o aprimoramento das atividades da administração a cada dia, sempre em busca de melhor qualidade na prestação dos serviços públicos, alcançando produtividade, redução de desperdício de dinheiro público, presteza, perfeição e rendimento funcional, como se estivéssemos diante de uma empresa privada.
Com a regularização fundiária plena, que corresponde a titulação de seus beneficiários, onde cada um “receberá a MATRÍCULA em seu nome”, a segurança jurídica estará alcançada.
É preciso evitar que situações jurídicas permaneçam por todo o tempo em nível de instabilidade, o que provoca incertezas. Isso não deve acontecer no direito urbano, pois o meio ambiente deve ter garantia de estabilidade, que é de excepcional interesse à vida, à saúde e ao bem-estar social.
A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NAS MÃOS DO MUNICÍPIO
A Constituição Federal de 1988 regulou a propriedade privada como direito fundamental vinculando-o à sua função social, ou seja, a propriedade privada tem uma função social que é o cerne de um processo de Regularização Fundiária correto e, portanto, indefectível.
A função social da propriedade como princípio constitucional utiliza os instrumentos jurídicos de política urbana que estão à sua disposição, para que num futuro não muito distante, as cidades possam estar mais bem ordenadas e capazes de oferecer uma vida digna a todos os seus habitantes, independentemente de classe social.
O uso adequado dos atuais instrumentos legais (Lei 13.465/2017 e provimentos das Corregedorias Gerais da Justiça) impõe aos gestores públicos, principalmente os municipais, certa dose de disposição, empenho e conhecimento técnico-jurídico notarial e registral imobiliário. Certamente esta aí o maior entrave para a obtenção de melhores resultados. Infelizmente, questões que não deveriam prevalecer, impedem o regular desenlace dessa questão, que alertamos, é um grande indutor do crescimento de problemas sociais e da violência urbana.
Ao visar à responsabilidade social do agente público comprometido com sua população, deve cair por terra a ideia de um Poder Público engessado, retrógrado e ancestral, já que o interesse social abrange a oferta de dignidade da pessoa humana, seu bem-estar de forma decorosa e a promoção da qualidade de vida em consonância com a sustentabilidade.
Assim, a responsabilidade social representa o compromisso contínuo de um agente público com seu próprio comportamento ético e com o desenvolvimento econômico, promovendo ao mesmo tempo a melhoria da qualidade de vida de sua população e de suas famílias, da comunidade local e da sociedade como um todo.
Cabe, especialmente ao governo municipal, instituir o controle do processo de desenvolvimento urbano, através da formulação de políticas do ordenamento espacial, nas quais interesses individuais dos proprietários coexistam, necessariamente, com outros interesses coletivos, como os sociais, culturais, econômicos, ambientais.
A LEI 11.977/2009 (MINHA CASA MINHA VIDA) e sua revogação através da LEI 13.465/2017
A Lei Federal nº 11.977 foi promulgada em 7 de julho de 2009 e é considerada um marco jurídico de caráter nacional que foi criada também com o objetivo de instituir mecanismos de incentivo e de estabelecimento de critérios de Regularização Fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas.
Além de conceituar, este diploma legal institui novos instrumentos e procedimentos, definindo ainda competências e responsabilidades, visando agilizar e efetivar os processos de regularização.
Com a regularização jurídica de assentamentos irregulares, visou a titulação de seus ocupantes, garantindo o direito social à moradia; o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana; e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
A Lei Minha Casa Minha Vida (11.977/09) veio para mudar a realidade da Regularização Fundiária no Brasil. O que antes se dava por meio de leis isoladas e de forma ainda não regulamentada, a lei veio e alterou completamente este panorama, facilitando a instauração da Regularização Fundiária.
Posteriormente, através da Medida Provisória 759 de 22 de dezembro de 2016 que em 11 de julho de 2017, foi convertida na Lei 13.465, se deu novos parâmetros regularizatórios, objetivando ainda mais, afastar da irregularidade ou clandestinidade, todo e qualquer núcleo informal, trazendo ainda mais facilidades para se efetivar a propriedade em nome de seus beneficiários. Essa nova lei manteve a devida atenção aos casos fáticos, consolidados e irreversíveis, sem se esquecer da proteção daqueles que se encontram em estado de iminente risco, com a previsão de necessárias remoções, bem como, se fosse o caso.
A forma mitigadora imposta às Regularizações Fundiárias promovidas perante as Prefeituras Municipais, se caracterizava ainda sob a égide daquela lei revogada e foi mantida na lei atualmente em vigor.
O procedimento de regularização se inicia com a protocolização junto à municipalidade, que diante da condição de consolidação e irreversibilidade do núcleo, da sequencia a seu curso normal até sua complementação, que em se finda com a emissão da Certidão de Regularidade Fundiária – CRF e de listagem que indique a quem cada unidade imobiliária pertencerá de forma individualizada, considerando o levantamento planialtimetrico Cadastral.
 Importante lembrar que, atualmente, com o advento da Lei 13465/2017, apenas e tão somente se faz necessária a “aprovação ambiental” se estivermos diante de uma gleba loteada com parte ou totalmente com incidência ambiental, ou que se situe em  região onde se caracterize como de unidade de conservação (aqui, dependendo de autorização de seu gestor).
A regularização fundiária acompanha a situação fática e nos casos em que não se tratem de núcleos de interesse social, ocupado por população de baixa renda, serão promovidas pelos próprios adquirentes de lotes irregulares, que muitas vezes, por ausência fiscalizatória do município, se viram inseridos numa demanda até então desconhecida, sendo obrigados a arcar com custos e obrigações inerentes ao “parcelador irregular” ou à própria municipalidade. Porém, cabe ressaltar, que os municípios tem o dever de promover ações reparadoras em face dos parceladores irregulares, utilizando-se de instrumentos “modernos”, como por exemplo, a “arrecadação de bens”.
A regularização fundiária, atualmente, pode ser feita até sobre área pública (Lei 13.465/2017), independentemente se esta localizada em zona rural, ter todos os equipamentos urbanos, ter incidência ambiental (APP) ou suas vias de circulação serem ou não oficializadas, pois, o que se pretende é dar um fim às questões fundiárias em nossos municípios.
Recentemente, em palestra proferida pelo Dr. Renato Guilherme Góes, um dos maiores conhecedores e defensores da nova legislação, para gestores públicos municipais, o mesmo foi enfático quando responsabilizou a cada um deles, caso não fizessem uso do instrumento legal ora disponibilizado. Foi duro quando indicou que aquele chefe do executivo, sabedor da possibilidade de oferecer à população de sua cidade, a dignidade e segurança jurídica de proprietário, assim não fizesse, deveria repensar sua trajetória política e deixar espaço para outros com a visão social e politicamente correta.
“Para finalizar, defendemos veementemente que onde inexiste a segurança jurídica de propriedade, onde não existe por conta da irregularidade fundiária, a escola pública e hospital público, o saneamento e as condições de vida digna, NASCEM AS QUESTÕES SOCIAIS E A VIOLÊNCIA URBANA. 
Nessas regiões, não existe futuro, não existe projeto de vida, não existe felicidade. Existem nessas regiões famílias desestruturadas, filhos doentes, velhos desesperados. Nessas regiões não existe esperança, não existe apego às regras sociais, não existe ordem. Nessas regiões existem facções criminosas, milícias tomando conta de uma população esquecida, abandonada, marginalizada e excluída como se fossem leprosos que devessem ser afastados do convívio social.”
Fonte: https://jeonline.com.br/noticia/13225/regularizacao-fundiaria-como-forma-de-promover-o-bem-estar-social
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