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29/06/2018

Obras paralisadas geram perda de até R$ 215 bilhões para o Brasil

Estudo da CBIC revela que apenas a conclusão das obras públicas do “Agora é Avançar” agregaria R$ 115,1 bilhões à economia do País

A incapacidade de investimento do Estado e os excessos nas ações dos órgãos de fiscalização e controle ocasionam milhares de paralisações de obras por todo o Brasil. Somente no programa “Agora é Avançar”, do governo federal, são mais de 7.400 obras paralisadas, a um custo de R$ 76,7 bilhões para que sejam retomadas e concluídas. Os dados que evidenciam essa paralisia enfrentada pelo setor de infraestrutura no Brasil estão presentes no estudo “Impacto Econômico e Social da Paralisação das Obras Públicas”, da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), em correalização com o Senai Nacional.

Encomendado à consultoria Inter.b, amplamente reconhecida como referência em assuntos ligados à infraestrutura, o objetivo do estudo foi colher informações disponíveis – ainda que escassas e incompletas – para determinar o impacto econômico dessas obras com recursos públicos paralisadas e as perdas associadas impostas ao País.

“A intenção da CBIC é chamar atenção para dois fatores que têm prejudicado bastante o setor e a sociedade: a falta de planejamento da Administração Pública, que contrata ou estabelece programas de obras sem que tenha recursos suficientes para desenvolvê-los, e a forma como os órgãos de fiscalização e controle têm agido na hora de determinar a paralisação de obras”, afirma Carlos Eduardo Lima Jorge, presidente da Comissão de Infraestrutura (COP) da CBIC.

O dirigente explica que, via de regra, as obras começam a ser executadas e, em determinado estágio, são paralisadas temporariamente ou até mesmo abandonadas por insuficiência de recursos. Além disso, Lima Jorge diz que a atuação dos órgãos de controle e fiscalização precisa ser contestada. “A mera presunção de erro ou falha em um projeto não pode ser responsável pela paralisação absoluta de uma obra. Isso traz um grande prejuízo. A obra paralisada não se traduz em economia para o erário público. Pelo contrário. Quando se paralisa uma obra, deixa-se de fazer investimentos, de gerar empregos e de atender à demanda da sociedade nas áreas de saúde, educação, transporte e segurança”, assegura.

Para o presidente da CBIC, José Carlos Martins, as paralisações podem ser ainda mais danosas à economia brasileira, já que muitas delas perdem o sentido econômico e social, não justificando a sua conclusão. “O dinheiro investido no início do projeto vai para o lixo”, reconhece. Martins ainda aponta os problemas com desapropriações, licenciamento ambiental e má qualidade dos projetos executivos como outros empecilhos para o término das obras.

 

IMPACTO NA ECONOMIA

Menos obras em andamento impactam o produto e a renda do Brasil. “Esse efeito se dá tanto direta quanto indiretamente, em prazo relativamente curto, por meio da demanda agregada”, diz o consultor Cláudio Frischtak, da Inter.b, explicando que há um efeito multiplicador do investimento: “Cada real adicional de despesas com investimento tende a provocar um aumento mais do que proporcional no Produto Interno Bruto (PIB) do País”.

Se retomadas, essas obras ajudarão o crescimento econômico. “A retomada de todas as obras daria um impulso no PIB. Supondo que as obras estariam ainda no seu início [1/3 dos trabalhos realizados], o impulso no curto prazo seria de 1,2% do PIB. Claro que as obras se completam, em média, em dois anos. Nesse sentido, uma parte do impulso seria no primeiro ano e a outra, no segundo”, ressalta Frischtak.

Nos cálculos do especialista, apenas a retomada e conclusão das obras paradas do programa “Agora é Avançar” adicionariam 1,8% ao PIB brasileiro no curto e médio prazo, na perspectiva da demanda agregada, o que representa um acréscimo de R$ 115,1 bilhões ao produto e à renda do País. No âmbito da oferta agregada, o término dessas obras aumentaria em 0,65% a capacidade de crescimento do Brasil, o chamado “produto potencial”, com um intervalo de 0,33% a 1,21%. Isso corresponde a R$ 42,4 bilhões por ano.

Ao longo desses dois anos, seriam gerados ainda cerca de 1,4 milhões de empregos diretos e indiretos, com base no impulso propiciado pela retomada das obras. O cálculo considera um estudo do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon), de janeiro de 2017, segundo o qual R$ 1 milhão investido na produção do setor de construção pesada gera 56 ocupações – diretas e indiretas – ao longo de um ano, com base na matriz de insumo-produto.

 

NÚMEROS CONSERVADORES

Embora seja de conhecimento público que há um grande número de obras inacabadas, pouco se sabe sobre sua magnitude total e as dimensões reais de seus impactos. Assim sendo, o estudo analisa ainda outros dois cenários.

Em um limite inferior, considerando-se as mais de três mil obras paralisadas do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e dos Ministérios da Saúde e das Cidades, seriam necessários R$ 39,5 bilhões para conclui-las. Retomadas e finalizadas, acrescentariam R$ 59,3 bilhões ao produto e à renda do Brasil, o equivalente a 0,9% do PIB no curto e médio prazo, na perspectiva da demanda agregada. Pelo lado da oferta agregada, haveria um impacto de 0,32% no PIB potencial de longo prazo – em um intervalo de 0,17% a 0,61%.

Já em um limite superior, somando as obras do “Agora é Avançar” e as financiadas com recursos estaduais e municipais, o custo para conclui-las chega a R$ 143,7 bilhões, com um retorno positivo de R$ 215,6 bilhões para o produto e a renda do País, o equivalente a 3,3% do PIB, na demanda agregada. Em relação à oferta agregada, a capacidade de crescimento do Brasil subiria 0,97% – com uma elasticidade de 0,50% a 1,82%.

Os autores do estudo destacam, no entanto, que os números estão certamente subestimados. “Em que pesem as incertezas envolvidas, todos os valores apresentados ignoram diversos outros possíveis impactos e podem ser considerados como estimativas conservadoras. Ainda assim, são valores expressivos e que refletem – ainda que imperfeitamente – as perdas de bem-estar da população e a competitividade do País”, destaca o estudo.

 

PERDAS PARA A POPULAÇÃO

“O maior prejudicado com a paralisação de uma obra é o cidadão, que deixa de receber um serviço público de qualidade”, garante José Carlos Martins, cuja visão é compartilhada por Frischtak: “O maior custo é o que a sociedade perde com os serviços associados aos projetos, que não podem ser ofertados”.

O estudo apresenta casos sobre os impactos para a população com as paralisações de três conjuntos específicos de obras: corredores viários do chamado Arco Norte, obras paralisadas e não iniciadas de saneamento e interrupções em obras de creches.

No primeiro caso, estima-se que haveria uma redução de 34% no frete com o funcionamento pleno das saídas do Arco Norte, com ganho potencial de US$ 765 milhões por ano para os produtores de grãos da região. Atualmente, a BR-163 apresenta obras inacabadas, incluindo um trecho de 100 km no Pará que carece de pavimentação adequada.

Já os valores associados às obras de saneamento podem ser estimados em: R$ 10,51 bilhões para as obras não iniciadas, e R$ 7,15 bilhões para as obras paralisadas. Somente nos três municípios com as menores taxas de acesso a redes de água e esgoto no Brasil, R$ 300 milhões foram gastos diretamente com internações e afastamentos do trabalho por doenças associadas a condições sanitárias, de 2007 a 2015. Para concluir as obras nessas cidades e melhorar a qualidade de vida da população local, seria gasto menos da metade desse valor.

Estima-se ainda que apenas as cerca de três mil obras de creches paralisadas – constantes em um levantamento da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal – retirem anualmente R$ 424 milhões da renda das famílias e subtraiam R$ 273 milhões anuais em benefícios futuros pelo investimento não realizado na primeira infância.

 

ENTRAVES NA LEGISLAÇÃO

No Sergipe, duas obras de grande importância estão paralisadas. A construção do Hospital do Câncer, discutida há seis anos e licitada há dois, encontra-se parada há um ano e meio. Já o Instituto Federal de Sergipe, embora com estrutura concluída, também tem sua conclusão entravada pelo mesmo período. Estima-se que o prejuízo financeiro com essas paralisações seja de R$ 50 milhões e que 20 mil pessoas deixem de ser beneficiadas com essas entregas. Quando se trata de pequenas e médias obras, 1 mil estão paralisadas no interior do estado.

“Obras com recursos federais são impossíveis de serem concluídas. Primeiro pela limitação dos preços. O preço máximo da obra já é o mínimo, porque é calculado com base em tabelas que nem sempre refletem a realidade e a lei ainda permite descontos. E segundo porque, ao longo da obra, muitas das regras e das normas estabelecidas pelos órgãos de controle confrontam a Lei 8.666/93. Os gestores não assinam nada por medo e isso termina paralisando as obras. Hoje, no Brasil se gasta R$ 10 milhões para economizar R$ 100 mil”, relata Luciano Franco Barreto, presidente da Associação Sergipana dos Empresários de Obras Públicas e Privadas (Aseopp).

A esperança de Barreto para reverter esse quadro está na reformulação da Lei de Licitações, em discussão no Congresso e com votação prevista para julho. O presidente da COP/CBIC explica que o PL 1292/1995 enfrenta essas questões em um dos artigos, condicionando a paralisação de obra à verificação de diversos aspectos: impactos econômicos e financeiros pelo atraso na entrega; riscos sociais, ambientais e de segurança da população local; custos de deterioração ou da perda das parcelas que já foram executadas na obra; despesas de desmobilização e posterior retorno às atividades; e fechamento de postos de trabalho – desempregos diretos e indiretos.

Tanto Aseopp quanto CBIC estão empenhadas em debater o projeto de lei e propor modificações a fim de melhorar a legislação. “A CBIC está tendo um papel importantíssimo para que a lei estabeleça regras que permitam maior qualificação dos licitados, preços justos e a não transferência para o construtor dos ônus e erros de projetos e planejamento”, diz Barreto.

 

PRIORIZAÇÃO DE INVESTIMENTOS

A duplicação de 220 km da BR-116, principal via que liga Porto Alegre ao Porto do Rio Grande, um dos mais importantes para o desenvolvimento do comércio internacional brasileiro, está parada por falta de verba e sem previsão de retomada. Em direção à fronteira com a Argentina, a duplicação de 230 km da BR-290 ocorre a passos lentos desde 2012 por questões orçamentárias, incluindo o aumento do preço do asfalto, e por aspectos relacionados ao Tribunal de Contas da União (TCU), como o limite de aditar até 25% o valor contratual. No atual ritmo da obra, ao menos mais cinco anos serão necessários para sua conclusão.

“A falta de duplicação dessas rodovias está impedindo o progresso do Rio Grande do Sul. É um custo que a sociedade está pagando há anos sem retorno”, declara Ricardo Portella, presidente do Sindicato da Indústria da Construção de Estradas, Pavimentação e Obras de Terraplenagem em geral no Estado do Rio Grande do Sul (Sicepot-RS). Com fluxo variando de acordo com o trecho, estima-se que até 15 mil veículos circulem por cada uma dessas vias diariamente. “Uma obra de R$ 1,3 bilhão, como é o caso da BR-116, se paga em aproximadamente três anos só com o aumento da velocidade média dos veículos pesados passando pela rodovia”, elucida.

Para Portella, o Brasil deve priorizar os investimentos: “O governo se preocupa em pagar o passado (os aposentados), o presente (o custeio da Máquina e dos funcionários públicos), e se esquece do futuro (os investimentos em infraestrutura). Sem reformas que possibilitem o Estado ser mais enxuto e os gastos com a Previdência serem diminuídos, vamos para a completa inviabilidade do investimento, que significa a inviabilidade do futuro da própria nação”.

Lima Jorge comenta que o estudo da CBIC é importante para pautar esses problemas em discussões de diversos fóruns que tratam das contratações de obras públicas, incluindo o Congresso Nacional. “A intenção é levar essa discussão para o Parlamento”, indica. Até que soluções sejam encontradas e postas em prática, o desenvolvimento da infraestrutura no Brasil estará estagnado e a população seguirá tolhida de usufruir desses milhares de empreendimentos por todo o País.

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