Logo da CBIC
08/06/2018

Proposta para regulamentação dos distratos avança no Congresso

O projeto de lei aprovado na Câmara estabelece regras que trazem maior segurança jurídica para incorporadoras e beneficiam consumidores adimplentes

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na tarde da última quarta-feira (6), proposta que disciplina os casos de desistência do contrato de incorporação imobiliária. O texto aprovado é um substitutivo do deputado José Stédile (PSB-RS) ao Projeto de Lei (PL) nº 1.220/15, de autoria do deputado Celso Russomanno (PRB-SP). A matéria, que agora segue para análise do Senado Federal, estabelece regras que trazem maior proteção para o mercado imobiliário, o qual vem sofrendo, nos últimos anos, com o aumento no número de litígios relacionados ao desfazimento de contratos. Dentre os pontos regulamentados, estão os valores a serem restituídos ao consumidor em caso de atraso da obra superior a 180 dias, bem como os valores que podem ser retidos pelas incorporadoras nos casos de “distratos”.

Há dois anos em debate, a aprovação do PL na Câmara é um avanço para o setor. A regulamentação dos “distratos” melhorará o ambiente de negócios e permitirá um maior equilíbrio nas relações comerciais, protegendo tanto os consumidores adimplentes quanto os empreendedores. Assim, os incorporadores passam a ter maior segurança jurídica e previsibilidade em seus empreendimentos e, da mesma forma, os compradores que cumprem com suas obrigações passam a ter mais segurança de que seus contratos serão executados.

A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) enxerga a regulamentação dos “distratos” como de extrema importância para o setor e tem contribuído, desde o início das discussões, para a formulação de regras claras e justas que beneficiem a todos os envolvidos, incluindo os agentes financiadores.

“Indiscutivelmente, o grande beneficiado é o consumidor adimplente”, afirma o presidente da CBIC, José Carlos Martins, explicando que uma empresa, ao contrair um financiamento, se compromete com determinado volume de vendas, sendo os “distratos” o grande empecilho para o cumprimento dessas metas. “Ao não consolidar as vendas, a empresa não recebe a parcela do financiamento e não consegue dar seguimento normal àquela obra, o que prejudica quem está adimplente. Sem crédito, no mínimo, há atraso de obras e o consumidor corre o risco de ver postergado o recebimento de seu imóvel”.

Nesse cenário, o agente financeiro também fica inseguro e, nos últimos anos, o crédito imobiliário se restringiu em razão do baixo número de vendas e do alto índice de “distratos”. “Ao ser regularizado o problema do ‘distrato’, o crédito volta e, com ele, os empregos. No fundo, o que estamos tentando é regular e simplificar o processo”, resume Martins.

Segundo o dirigente, no pico da crise, empresas de capital aberto viram 70% dos seus contratos desfeitos. Dentre os associados da CBIC, esse percentual chegou à faixa dos 20-25% e depois começou a descer. “Hoje, deve estar em torno de 15-17%”, estima Martins. “Empresas menores têm um número menor de ‘distrato’, porque é uma venda mais próxima e sempre existe mais chances de se fazer um acordo”.

Durante a aprovação do PL na Câmara, o deputado José Stédile reforçou que “o bem jurídico maior deve ser a proteção dos consumidores que se mantêm no empreendimento e, portanto, querem efetivamente cumprir e ver cumpridos seus contratos”. Por sua vez, o autor do projeto enxerga que a proposta atende tanto às necessidades do setor empresarial quanto às dos consumidores. “Faz com que essas pessoas consigam resolver o problema sem terem que demandar uma ação judicial”, declarou Russomanno.

Celso Petrucci, presidente da Comissão da Indústria Imobiliária (CII) da CBIC, comentou o resultado da aprovação: “Depois de mais de dois anos de negociação, o setor imobiliário passa a ter um novo marco regulatório que trará maior segurança na comercialização de seus empreendimentos. Não existem vencedores nem vencidos, o texto aprovado pela Câmara dos Deputados foi o possível”.

 

PRINCIPAIS PONTOS DO PROJETO

Com o PL aprovado, na forma de um substitutivo, alguns pontos extremamente relevantes foram conquistados. Um avanço foi a previsão expressa dos valores a serem pagos em caso de desfazimento do contrato, o que traz enorme segurança jurídica ao incorporador, que passa a ter maior previsibilidade do seu negócio.

No caso de dissolução do contrato, seja por “distrato” ou inadimplemento do adquirente, a incorporadora poderá reter a comissão de corretagem e a pena convencional equivalente a 25% da quantia paga pelo consumidor – a multa prevista no projeto original era de 10%. A devolução dos valores deve ocorrer em até 180 dias.

Estando o adquirente em posse da unidade imobiliária, o PL prevê que o usuário deverá pagar pelas cotas condominiais e contribuições devidas a associações de moradores, pelos impostos incidentes sobre o imóvel e pela fruição do bem (calculada de acordo com contrato ou determinação de juiz).

A proposta estipula também que a entrega do imóvel pode ser feita em até 180 dias corridos após a data prevista contratualmente, sem penalidades para o incorporador. Essa cláusula de tolerância já era permitida pela Lei 4.591/64, mas vinha gerando centenas de litígios judiciais por ser considerada abusiva. Muitas decisões condenaram os incorporadores a pagarem altas multas, bem como lucros cessantes e, em alguns casos, até danos morais. Essa questão já vinha sendo pacificada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas o PL vem consagrar a validade da cláusula.

Quanto à penalidade pelo atraso na entrega do imóvel em mais de 180 dias, se houver desistência do contrato pelo comprador, o incorporador deverá restituir a integralidade de todos os valores pagos, além de multa contratual, em até 60 dias corridos. No entanto, havendo continuidade do contrato, o adquirente fará jus, por ocasião da entrega da unidade, a uma indenização de 1% do valor pago para cada mês de atraso.

Dado que a incorporação esteja submetida ao regime do patrimônio de afetação, o incorporador poderá reter até 50% dos valores pagos, após dedução antecipada da corretagem. O valor deve ser restituído em até 30 dias após a expedição do habite-se ou de documento equivalente. Como nesse regime é criada uma segunda empresa para tocar o empreendimento, tendo patrimônio separado da construtora e tributação diferenciada, o agente financiador tem maior segurança de retorno.

Uma novidade a ser observada é o direito de arrependimento em benefício do comprador no prazo improrrogável de sete dias, sempre quando o contrato for firmado fora do estabelecimento do incorporador ou nos estandes de vendas, com a devolução de todos os valores antecipados. No caso de o comprador não se manifestar nesse período, o contrato será considerado irretratável.

Importante destacar que o PL 1.220/15 vem alterar a Lei 4.591/64 – que trata das incorporações imobiliárias – e valerá, não havendo lei específica em sentido contrário, também para as incorporações (de mercado) submetidas ao Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV).

 

MOBILIZAÇÃO DO SETOR

A CBIC, como representante do setor, vem colaborando para que a versão final do PL a ser aprovada no Congresso Nacional seja a mais adequada. A entidade tem atuado junto aos diversos atores envolvidos nas discussões e aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Recentemente, por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) realizou o II Seminário “Incorporação Imobiliária na Perspectiva do STJ: A Proteção do Consumidor”, no qual o presidente do Conselho Jurídico (Conjur) da CBIC, José Carlos Gama, foi um dos palestrantes a abordar o assunto. Dentre os graves problemas advindos das rescisões contratuais unilaterais, foram citados: insegurança jurídica, atrasos e paralisações de obras devido à inviabilidade econômica, redução de receitas, aumento do custo pela incerteza do resultado final, suspensão de financiamentos, estímulo à litigância de má fé e queda da atividade produtiva. Na ocasião, ressaltou-se a busca por uma solução desse impasse. “Se deixarmos de ter um cabo de guerra – onde de um lado está o incorporador e do outro o consumidor – e nos dermos as mãos, e a Justiça fizer o que é mais importante, que é mediar e conciliar, chegaremos a esse Brasil justo”, disse Gama.

Embora o avanço dado no Congresso tenha sido muito importante, o presidente da CBIC comenta que a questão ainda preocupa, porque o PL tem um caminho a percorrer no Senado. “É um dos maiores problemas que temos hoje, porque afeta a saúde financeira das empresas, o que gera desemprego; e causa insegurança em quem faz o investimento, no financiador e no comprador. No final das contas, dá um desequilíbrio total no sistema e é ruim para todo mundo, principalmente para o consumidor adimplente”, alertou Martins.

Em seu voto como relator, Stédile enfatizou que um empreendimento imobiliário deve chegar à sua conclusão, com a entrega das unidades prometidas, sendo esta uma segurança para o adquirente e para o setor. “A melhor proteção que se pode dar à sociedade é propiciar acesso à moradia, por meio de um mercado seguro e equilibrado, que viabilize a oferta de habitação a preços viáveis e a concessão de crédito de longo prazo ao consumidor”, declarou o deputado, mencionando o perigo advindo dos “distratos”: “Não se pode, em uma suposta defesa de um interesse individual do comprador de unidades, colocar em risco o direito coletivo daqueles consumidores que pretendem de fato se manter no empreendimento e, em última instância, todas as famílias que planejam a aquisição da casa própria”.

O texto deve chegar ao Senado Federal no início da próxima semana e a expectativa do setor é que o PL tramite e seja aprovado rapidamente na Casa devido à importância da regulamentação para o desenvolvimento do mercado imobiliário, para a geração de empregos e para que os futuros negócios sejam fechados em um ambiente de segurança e certezas.

COMPARTILHE!