Produtos imobiliários têm na informação o segredo para o sucesso
Foco no consumidor, boa análise de dados e formatação jurídica adequada tornam-se, cada vez mais, indispensáveis para o lançamento de empreendimentos com menor risco
“O mundo e o comportamento das pessoas estão mudando em uma velocidade tão grande que não temos mais aptidão para desenvolver produtos sozinhos”, afirma Eduardo Pricladnitzki, sócio fundador da incorporadora Wikihaus, de Porto Alegre/RS. Com essa visão, a empresa desenvolveu uma metodologia para ouvir pessoas a fim de colaborar na concepção de novos produtos. Como “fruto dessa inteligência coletiva”, foi lançado na capital gaúcha, em 2016, um coliving – hoje uma das principais tendências do mercado imobiliário – que foi sucesso de vendas. “Quanto mais próximos estivermos dos consumidores e mais estivermos observando as mudanças de comportamento, mais assertivos serão os produtos”, assegura.
Foi graças à adequada coleta e análise de informações e tendências junto aos consumidores que a Wikihaus conseguiu lançar com triunfo um produto inovador. Este é sempre o objetivo que as empresas almejam ao colocar um novo empreendimento no mercado, entretanto, os desafios são enormes e somente agora os empreendedores estão enxergando os substanciais benefícios de ir atrás de mais dados para a tomada de decisões.
A incorporação imobiliária é uma atividade de longo prazo, o que traz seus riscos, conforme esclarece Celso Petrucci, presidente da Comissão da Indústria Imobiliária (CII) da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). “Do começo ao final de um empreendimento imobiliário, estamos falando de um ciclo de cinco a sete anos. E mesmo os empresários mais bem sucedidos costumam dizer que não se acerta 100% das vezes, então trata-se de uma atividade de alto risco”, relata. Para mitigar as ameaças e procurar “errar” menos, é necessário buscar informações de todas as fontes possíveis, visando adequar o produto ao mercado.
“O mercado imobiliário sempre foi muito pesado, complexo e tradicional; e as coisas estão mudando em uma velocidade tão rápida que até o nosso mercado vai acabar sendo impactado de forma bem significativa. O principal segredo para qualquer empresa é realmente a CONEXÃO COM AS PESSOAS, entender que elas são o futuro do consumo. O mercado imobiliário anda muito por tendências, olha o que está sendo lançado e replica. Está começando a cair a ficha de que temos que olhar menos para oferta e mais para o consumidor, porque isso traz mais assertividade para os resultados do empreendimento e possibilita encontrar inovações”. EDUARDO PRICLADNITZKI, sócio fundador da incorporadora Wikihaus.
Um tipo de informação, dos mais essenciais, que precisa ser obtido pelos empreendedores é quanto à formatação jurídica desses novos negócios imobiliários que estão surgindo, a fim de evitar adversidades pelo caminho. “Estamos passando por um momento de transformação, com o surgimento de novos produtos sem que haja ainda a criação de leis para regulamentá-los. Enquanto isso, esses produtos têm que ser criados de forma versátil, para que possam se adaptar a regulamentações futuras”, afirma o advogado Rodrigo Bicalho, sócio de um dos maiores escritórios de Direito Imobiliário do Brasil, o Bicalho e Mollica Advogados.
INFORMAÇÃO COLABORATIVA
Eduardo Pricladnitzki explica que existem dois tipos importantes e complementares de informação. O primeiro é para a compra de um terreno, com base em dados quantitativos macroeconômicos, como demanda e oferta; e o outro para o desenvolvimento do produto, com conhecimento do perfil do consumidor. O empresário detalha a metodologia aplicada em sua empresa: “Normalmente, contratamos uma empresa de facilitação e trazemos para dentro do escritório pessoas que já moram em apartamentos com tipologias similares às que queremos conceber, para que possamos entender todas as dificuldades e necessidades que tenham para buscar soluções. Às vezes, as soluções acabam se tornando inovadoras”. Essa abertura maior para a participação dos consumidores na concepção de um produto e na sugestão de soluções resulta na chamada “informação colaborativa”, que pode levar a proposições surpreendentes não percebidas antes pelos gestores do negócio.
Para obter informações sobre os consumidores, atualmente existem diversas formas. O monitoramento de mídias sociais, a pesquisa de mercado, a colaboração (como tem feito a Wikihaus) e a observação de cases são algumas das opções. “A tecnologia aproximou todo mundo do conhecimento. Hoje, o grande desafio do gestor não é conseguir informação, mas saber analisar e organizar toda essa informação disponível”, aponta o empresário.
Devido ao setor da construção civil e, em particular, ao mercado imobiliário terem empresas muito grandes e muito pequenas, com maior ou menor acesso à tecnologia, cada uma precisa encontrar sua maneira de chegar a essas informações. Pricladnitzki aconselha: “A principal dica que se encaixa a qualquer incorporadora é a disciplina para buscar os dados, saber exatamente o que se quer, qual dor precisa ser resolvida e, de alguma forma (com ajuda externa ou interna), tentar criar uma metodologia apropriada para transformar isso em produto”.
Celso Petrucci sintetiza a importância da informação para o sucesso de um negócio: “Desenvolver informações colaborativas, contar com empresas de inteligência de mercado e conhecer estruturas jurídicas e financeiras competentes servem para que os empresários, quando forem prospectar os empreendimentos, juntem o maior número de informações possíveis e somente partam para a aquisição de um terreno, com o desenvolvimento de um produto, quando estiverem bastante seguros ou quando tiverem a convicção de que aquele risco no negócio foi mitigado pela gama de informações capturadas antes de iniciar os investimentos”.
FORMATAÇÃO JURÍDICA
Com o desenvolvimento desses novos produtos imobiliários, também se torna indispensável obter informações de caráter jurídico. O advogado Rodrigo Bicalho igualmente acredita que está havendo uma transformação de costumes na sociedade. “Não se discute mais apenas a questão imobiliária, é uma questão que envolve aspectos culturais, sociais, tecnológicos e, em torno disso tudo, o espaço urbano. Dessa combinação, faz com que existam alguns produtos que não têm lei própria”, comenta.
Interessantes discussões jurídicas já são travadas em torno de alguns temas, como a natureza de um contrato de coworking ou a legalidade da limitação de locação e uso a estudantes, no caso de moradias estudantis. “Não existe, em nossa legislação, a previsão desses tipos de serviços e isso tem reflexos na questão contratual e tributária. O Poder Público também não sabe muito bem como agir, então vemos cidades que criam leis para restringir ou tributar de forma diferente”, elucida o advogado. Atualmente, já existem leis municipais criadas e projetos de leis em tramitação. “A tentativa de regulamentação é bastante ampla”.
Bicalho indica ainda que, embora haja problemas com essas formatações jurídicas, o percentual é muito baixo: “Há operações ocorrendo com muito desenvolvimento, crescendo muito a cada ano, mas com um número de problemas ainda pequeno”. No entanto, o empresariado precisa estar atento a esses movimentos legislativos, porque, ainda que as leis organizem melhor as atividades, elas também podem cerceá-las. “O empresário tem que entender que está tratando com um produto complexo, o qual a legislação não prevê, e que, portanto, precisa ter uma regulamentação muito bem feita para tentar se antecipar e evitar os conflitos”, alerta.
Essa regulamentação deve ser feita pelo empreendedor com o suporte jurídico de seus advogados, que deve orientar, por exemplo, quanto à forma de elaborar o memorial de incorporação, a convenção de condomínio e os contratos de disponibilização desses espaços. “Esse público consumidor tem maior rotatividade, não cria raízes nesses espaços e é mais dinâmico. Tudo isso tem que estar previsto nas formas de contratação, que precisam ser menos formais e mais versáteis”, recomenda.
ÍNDICES NACIONAIS
Todas essas questões foram debatidas em painel da CII/CBIC durante o 90º Encontro Nacional da Indústria da Construção (Enic), realizado na última semana, em Florianópolis/SC. Toda a programação da comissão no evento contou com o apoio do Senai Nacional, que também é correalizador do projeto “Índices do Mercado Imobiliário”, outra iniciativa da CII.
Esses índices compõem uma relevante informação que os empresários encontram ao seu dispor para balizar decisões, e, para fornecê-los, a CBIC conta com o apoio de todo o setor. “Tem outro lado da informação que é o que buscamos através de indicadores imobiliários Brasil afora. Como entidade representativa do setor, a CBIC tem a necessidade e a obrigação de obter o maior número possível de informações sobre o mercado, para saber quais são as tendências e poder subsidiar melhor nossos pleitos juntos aos governos municipais, estaduais e federal, assim como junto aos bancos e ao Conselho Curador do Fundo de Garantia”, reforça Petrucci. Os índices são divulgados trimestralmente pela entidade e os resultados do primeiro trimestre de 2018 serão conhecidos na próxima segunda-feira, 28 de maio.