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23/12/2019

Artigo do especialista: Congresso derruba veto do PL 888/2019

Erika Albuquerque Calheiros é assessora jurídica da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC)

 

No dia 29 de outubro do corrente ano, o plenário do Senado Federal aprovou o Projeto de Lei 888/2019, que dispõe sobre o Regime Especial de Tributação (RET) para a incorporação e construção de imóveis residenciais no âmbito do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV). No entanto, na data em 12 de dezembro tivemos notícia que o presidente da república vetou integralmente o texto do projeto de lei.

Contudo, em 17 de dezembro, o Congresso Nacional, ciente da importância do tema para o setor da construção civil e para a continuidade do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) rejeitou o veto total da Presidência da República, de forma que o Pl, em breve será publicado como Lei.

Com a extinção do RET no montante de 1% para incorporações e construções de habitações de interesse social no final do ano passado (31/12/2018), interpretações equivocadas da lei dadas por técnicos da Receita Federal do Brasil, geraram uma enorme insegurança jurídica, provocando a necessidade de se procurar o Poder Judiciário para o restabelecimento do objetivo real da lei.

A questão diz respeito a que fato está atrelado o marco temporal da lei. A Receita Federal vinha entendendo que o benefício de 1% somente teria efeito para as receitas recebidas até 31/12/2018, enquanto a interpretação teleológica correta da lei é que o benefício seria válido para os contratos assinados até 31/12/2018. Isto porque os referidos contratos são celebrados com o FAR (Fundo de Arrendamento Residencial), representado pela Caixa Econômica Federal, na modalidade de obra por empreitada global, onde na composição do BDI (Benefícios e Despesas Indiretas), foi aceito pelo órgão como impostos federais na composição do preço final a alíquota de 1%. A interpretação dada pelos técnicos da Receita Federal geraria um desequilíbrio econômico-financeiro do contrato a propiciar aditivos que gerariam mais despesas para o Fundo.

O PL 888, promovendo a correta interpretação da norma vigente, e não sua prorrogação por prazo indeterminado, por meio do artigo 3º, consolida que as empresas que tiveram seus contratos assinados e registrados no cartório competente até 31/12/2018 continuam beneficiárias do regime especial tributário até o recebimento integral das vendas de todas as unidades que compõem o memorial de incorporação registrado, independentemente da data de sua comercialização e, no caso de contratos de construção, até o recebimento integral do valor do respectivo contrato.

Importante ressaltar que, primeiramente não há que se falar em prorrogação do benefício, como descrito na mensagem do veto presidencial, mas sim da correta interpretação dos dispositivos legais.

Não é crível que a Administração Pública, contrate com uma empresa construtora ou incorporadora, assentando as regras tributárias inclusive no contrato firmado e, logo em seguida ou meses depois, venha revogar o benefício declarado. A correta interpretação é que o benefício deva prevalecer enquanto perdurar o contrato (prazo determinado), já que o contratado assumiu o compromisso com base na previsão financeira pactuada.

Sendo assim, não há que se falar em prorrogação de benefício por prazo indeterminado, justamente porque trata-se de manutenção da previsibilidade e da equidade fiscal até o termo final do contrato, portanto, com prazo certo e delimitado no instrumento contratual.

Esta medida traz segurança jurídica para o setor e para o poder público, evitando medidas judiciais para revisão dos contratos em razão de despesas supervenientes não contabilizadas.

Portanto, o PL é consentâneo com o interesse público na medida em que estar-se-á diminuindo os custos da própria União quando do pagamento do PMCMV faixa 1, que é subsidiado, em quase sua totalidade, pelo Poder Público.

Novas regras para 2020.

Com o término do benefício fiscal do RET com alíquota de 1%, gerou-se uma injustiça fiscal, pois a partir de então, os empreendimentos de interesse social passaram a ter uma carga tributária federal pelo lucro presumido de 6,73% do faturamento, enquanto empreendimentos para atender a demanda de mercado (classes média e alta), permaneceram com a possibilidade de pagamento do RET de 4% sob o regime de patrimônio de afetação.

De forma a corrigir esta injustiça fiscal, o projeto de lei também cria novas regras a partir de 1º de janeiro de 2020. De acordo com o artigo 4º, a partir de janeiro do próximo ano, a empresa construtora que tenha sido contratada ou tenha obras iniciadas para construir unidades habitacionais de valor de até R$ 124.000,00 (cento e vinte e quatro mil reais) no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), fica autorizada, em caráter opcional, a efetuar o pagamento unificado de tributos equivalente, a não mais a 1%, mas sim a 4% (quatro por cento) da receita mensal auferida pelo contrato de construção até o recebimento integral do valor do respectivo contrato, uniformizando a carga tributária no mercado imobiliário.

Essa regra também valerá para empresas que construam unidades habitacionais de interesse social para vendê-las prontas. Alteração legislativa promove, portanto, segurança jurídica e fiscal.

O referido Projeto de Lei,vem, portanto, para  restabelecer a tão necessária segurança jurídica para os negócios imobiliários, bem como a justiça fiscal para as unidades de interesse social, pois é nessa faixa de renda onde se concentra o maior déficit habitacional brasileiro, daí, mais uma vez, o interesse público e social da medida.

Das decisões judiciais a respeito do tema

Várias foram as decisões judiciais a respeito do tema, cujo respeito traz-se à baila:

“(…) A Lei n.11.977/2009 dispõe sobre o Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV e, em seu art.2º, fixa expressamente:

Art. 2 Para a implementação do PMCMV, a União, observada a disponibilidade orçamentária e financeira. (Redação dada pela Lei nº 12.424, de 2011) I – concederá subvenção econômica ao beneficiário pessoa física no ato da contratação de financiamento habitacional; (…) III – realizará oferta pública de recursos destinados à subvenção econômica ao beneficiário pessoa física de operações em Municípios com população de até 50.000 (cinquenta mil) habitantes

  1. A União, pois, com o objetivo de implementar política pública habitacional, criou o Programa Minha Casa Minha Vida, por meio do qual foi viabilizado o financiamento de moradias para famílias de baixa renda. Para tanto, o programa, conforme a legislação de regência, procede à oferta pública de recursos federais, os quais, após o procedimento concernente, serão repassados à instituição ou agente financeiro conveniado, que, por sua vez, ficará responsável pela contratação do agente executor (construtora), pela intermediação dos contratos com os beneficiários indicados pelo Município e pela destinação dos valores repassados com vistas ao financiamento das obras.
  2. O Governo Federal atua, desta forma, como ente financiador do programa, haja vista a oferta de recursos destinados à subvenção econômica para beneficiários do programa em municípios com até 50 mil habitantes. A execução das obras e a intermediação das operações financeiras junto aos beneficiários são delegadas à instituição ou agente financeiro vencedor da oferta pública.
  3. A contratação da pessoa jurídica responsável pela execução da obra (construtoras) segue, pois, um modelo de negócio. É dizer, o negócio jurídico é firmado a partir de determinadas premissas estruturais e determinantes para o ajuste. A contratação é realizada por meio da fixação do preço fechado, digo, global, considerando as despesas incidentes, inclusive tributárias, e as receitas aplicáveis à época da contratação.
  4. Acerca do regime tributário aplicável às receitas mensais auferidas pela empresas construtoras que tenham firmado contratos para a construção de imóveis de interesse social, a Lei n.12.024/2009, dando nova redação aos arts.4º, 5º e 8º da Lei n.10.931/2004, estabeleceu, in verbis:

Art. 2º Até 31 de dezembro de 2018, a empresa construtora contratada para construir unidades habitacionais de valor de até R$ 100.000,00 (cem mil reais) no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, de que trata a Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, fica autorizada, em caráter opcional, a efetuar o pagamento unificado de tributos equivalente a um por cento da receita mensal auferida pelo contrato de construção. (“Caput” do artigo com redação dada pela Medida Provisória nº 656, de 7/10/2014 e convertida na Lei nº 13.097, de 19/1/2015) § 1º O pagamento mensal unificado de que trata o caput corresponderá aos seguintes tributos: I – Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas – IRPJ; II – Contribuição para o PIS/Pasep; III – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL; e IV – Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS.

  1. Como visto, a sistemática de recolhimento tributário aplicável a referidos contratos obedece uma lógica especificamente fixada para tanto, no caso, estabelecendo o Regime

Especial de Tributação (RET), assegurando à construtora contratada o recolhimento de tributos à base de um por cento da receita mensal auferida pelo contrato de construção.

  1. Em que pese a interpretação que vem sendo delineada pela União no sentido de que o art.2º da Lei n.12.024/2009 teria estabelecido o dia 31 de dezembro de 2018 como termo final para aplicação do RET, ou seja, que o RET apenas teria vigência até referida data, entendo que esta interpretação não se mostra consentânea aos fins a que a norma se destina.
  2. Logo, entendo que suprimir o RET impõe alteração nas condições econômicas, implicando necessariamente a revisão completa das condições do negócio jurídico, no caso, em prejuízo da própria União, haja vista as despesas provenientes do aumento da carga tributária a ser aplicada à receita mensal auferida pelo contratado.
  3. O direito à manutenção do equilíbrio do contrato deve, pois, ser assegurado à empresa contratada pela Administração Pública, preservando-se a segurança jurídica e, principalmente, das condições em que o pacto foi firmado.
  4. De tal sorte, penso que a melhor interpretação da norma, dentro de um contexto hermenêutico alinhado às finalidades para a qual foi editada, deve ser no sentido de que o Regime Especial de Tributação é aplicável até o final do contrato firmado até 31/12/2018, com a conclusão da obra contratada (…) Sentença n. 438/2019/RLBSZ/JF/AL – 3ª Vara – Tipo A.

Nesse sentido, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), instituição que subscreve este documento, solicita que o veto do Projeto de Lei nº 888/2019 seja devidamente apreciado e derrubado por este Congresso Nacional em prol do desenvolvimento econômico e da segurança jurídica desse modelo de empreendimento imobiliário, que tem, por suas características, a capacidade de proporcionar moradia digna a população brasileira e, ainda, gerar empregos, tributos e renda

 

*Artigos divulgados neste espaço, não necessariamente correspondem à opinião da entidade.

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